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#59

Rio de Janeiro, 12 de outubro de 2010

Carlos,

Te escrevo hoje porque se aproxima o dia do mestre. Esse ano, ele cai numa sexta-feira. Feriado prolongado, eu (quase) sempre dava um jeito de fugir do trabalho e embarcar com você em algum tipo de aventura. Você sabe porque eu disse 'quase', não sabe? Você se lembra... Eu lembro.

Mas hoje, ao acordar, ouvi um burburinho de crianças entrando pela janela. Tentei entender se era sábado ou domingo e porque haveria de ter tantas crianças na rua a uma hora dessas. Mal sabia que horas eram, mas a essa altura da vida, qualquer hora é má hora para o som das crianças. Tentei olhar o calendário que fica na parede do banheiro, mas percebi que ele era de dois anos atrás. Não sei se foi o sono, mas fiquei um tempo pensando na possibilidade de tudo isso ser um sonho. De não ter, de fato, vivido os últimos dois anos. De ter adormecido na cama, e acordado meio atordoada depois de um pesadelo.

Corri para abrir os armários, procurei por suas roupas e, quando finalmente acordei, percebi que minhas próprias roupas estavam espalhadas pelo chão do quarto. De seu, só a minha dor. Não havia sequer uma camisa de dormir pra me lembrar teu cheiro. Deitei por cima das roupas. Quis dormir de novo, mas o burburinho havia aumentado.

Levantei, tomei um banho. Desses que a gente toma quando volta de cemitério. Como se a água pudesse afastar os maus espíritos e o sabão limpar minha alma. Durante o banho lembrei da última carta. Percebi que deveria ser perto de outubro e, pelo burburinho das crianças e as buzinas, só podia ser dia 12. Fiz uma coisa que não faço habitualmente. Liguei pra Alice. 

Conversei com ela por alguns minutos, mas não lembro bem sobre o que falamos. Sabe aquela sensação de que as palavras se perdem no vácuo?  Como se eu fosse incapaz de entender aquelas trivialidades. Ela me confirmou que hoje era dia das crianças e que pretendia ir com o Matheus a algum lugar, acho que a praia e inclusive me chamou pra ir. Recusei, claro. Precisava te escrever.

E te escrevo debruçada por cima de minhas roupas velhas. Roupas que vesti com você. Nesse momento, estou agarrada ao cachecol violeta que você me deu, quase como se ele guardasse seu cheiro por dentro dos fios de lã. Como sinto falta do teu cheiro. Como sinto falta de estar viva.

Olívia.

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3 comentários:

Anônimo disse...

O Carlos é professor igual ao Luiz? Será que o Luiz vai me largar um dia, gente...

Suzana disse...

hummm...

não desejo isso a vc, amiga, pq sei que vc perderia o chão.

mas pensa no tanto de cartas lindas que vc escreveria? hahaha

Giselle disse...

O Carlos é professor, mas acho que não é igual ao Luis... Tá se identificando com a Olívia? Tenso...

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